(Uma adenda no final deste texto.)
Em Portugal insiste-se na imposição – inútil, ilegítima, ilegal – do «aborto pornortográfico». No Brasil… não é uma prioridade assim tão grande, a pressa não é muita. Aliás, lá a vontade preponderante pode até já nem ser a de implementar este «acordo» mas sim outro, provavelmente ainda mais radical: em Outubro de 2013 a Comissão de Educação, Cultura e Esporte (Desporto) do Senado em Brasília aprovou a criação de um «grupo de trabalho destinado a estudar e apresentar proposta para aperfeiçoar o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa». É de duvidar que por «aperfeiçoar» se entenda devolver as consoantes ditas «mudas», os hífens e as maiúsculas que levianamente foram roubadas à ortografia dos dois lados do Atlântico.
Em Portugal insiste-se na imposição – inútil, ilegítima, ilegal – do «aborto pornortográfico». No Brasil… não é uma prioridade assim tão grande, a pressa não é muita. Aliás, lá a vontade preponderante pode até já nem ser a de implementar este «acordo» mas sim outro, provavelmente ainda mais radical: em Outubro de 2013 a Comissão de Educação, Cultura e Esporte (Desporto) do Senado em Brasília aprovou a criação de um «grupo de trabalho destinado a estudar e apresentar proposta para aperfeiçoar o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa». É de duvidar que por «aperfeiçoar» se entenda devolver as consoantes ditas «mudas», os hífens e as maiúsculas que levianamente foram roubadas à ortografia dos dois lados do Atlântico.
Entretanto,
sucedem-se os sinais de que a tão apregoada «uniformização» mais não é do que
uma miragem propiciada, talvez, pelo calor dos trópicos. Em Setembro de 2013
foi noticiado que a Embaixada do Brasil em Maputo lançara um concurso para
director do Centro Cultural Brasil-Moçambique, que tinha como um dos requisitos
“desejável conhecimento da escrita portuguesa na vertente brasileira”. Não estava
previsto que o AO90 acabasse com a «vertente brasileira», e todas as outras
vertentes, da escrita portuguesa? Ou terá isso a ver com o adiamento da entrada
em vigor do dito cujo do outro lado do Atlântico? Se sim, talvez isso explique
o facto de na edição e distribuição de livros portugueses no «país irmão» ainda
ser necessário, em vários casos, proceder-se a alterações. Como o da Porto
Editora, que, soube-se em Janeiro deste ano, adaptou os seus dicionários de
língua portuguesa para o mercado brasileiro, como o «Grande Dicionário», que
foi redigido «em português do Brasil à luz do acordo ortográfico». O que será essa
«luz» do AO? Mais alguma inovação introduzida pelas cabeças «brilhantes» que
conceberam o (des)acordo? E há ainda o caso – que me é mais próximo, pois
trata-se de um amigo – do livro de Paulo Monteiro «O Amor Infinito que te Tenho e Outras Histórias», que em terras de Vera Cruz recebeu o título «O Amor Infinito que Tenho por Você e Outras Histórias».
Em Portugal a
unanimidade governamental quanto à «uniformidade» ortográfica é apenas aparente.
Porque há, pelo menos, a excepção de Rui Machete, ministro dos Negócios
Estrangeiros, que, em Setembro último, disse em Nova Iorque aquilo que não diz em Lisboa: o AO90 «não
é certamente a única maneira de desenvolver a língua. (…) Nós temos tido alguma
dificuldade em conseguir realizar o projecto que se tinha de o Acordo Ortográfico
ser tão vital para o desenvolvimento da língua. Eu acho que é bom haver algumas
regras básicas mínimas, mas para isso temos que deixar a língua fluir. E,
portanto, nesta matéria teremos de, após alguns anos, observar e ver se não
temos que fazer algumas pequenas alterações.» A «alguma dificuldade» é um
eufemismo, tal como as «pequenas alterações»… aliás, a única «alteração» que há
a fazer ao AO90 é destruí-lo.
Também nas
três principais estações de televisão nacionais são raras as «dissidências» à
«nova (des)ordem ortográfica». Na SIC são de destacar duas vozes corajosas e
desassombradas: Hernâni Carvalho, para quem «esta nossa menoridade, esta nossa
pequenez» explica a existência deste «acordo» que é mais «ortopédico pelos
pontapés que dá na gramática», e que as pessoas «que escreveram isto estavam a
dormir, não estavam acordados»; e Miguel Sousa Tavares, para quem «por inércia,
por preguiça ou por cobardia, vamos assistir a uma revolução para pior na
Língua Portuguesa», para mais ilegal, porque «os próprios signatários que aprovaram
a entrada em vigor do tratado violaram as normas, tornando-o obrigatório sem
que haja o número de assinaturas exigido pelo próprio tratado.» Além de
jornalistas, os dois são também escritores… que, nessa qualidade, estão em
clara discordância com, nomeadamente, Valter Hugo Mãe. Que, em Dezembro de
2013, escreveu na sua página de Facebook: «Também acho estranho que muita gente
diga mal do acordo ortográfico quando não lhes vejo pudor em dizer selfie e
site, like, smartphone, download, ou deslocalização e coalisão mais outras
americanices que nos afastam mais da alma portuguesa do que qualquer c que
desapareça.» Das duas, uma: ou VHM não consegue compreender, ou não quer
compreender, que os opositores do AO90 têm toda a legitimidade para usar
anglicismos… porque não querem cortar letras «supérfluas» nem deixar de usar
palavras «arcaicas»… como, por exemplo, e precisamente, phone (de smartphone).
Nos outros
países não existem estas parvoíces. É certo que já foram feitas algumas
tentativas de alterar a ortografia do Alemão e do Inglês, mas que, porém, não
tiveram a dimensão… e a concretização da que presentemente afecta o Português. Lá
fora valoriza-se o ser convicto quanto à identidade, dignidade e idoneidade linguísticas,
e evitam-se intervenções artificiais. Cá dentro, a julgar pelo que se lê no
jornal Expresso, há quem prefira ser, simplesmente, «convito». (Também no MILhafre (82) e no sítio da ILCAO.)
(Adenda – Nunca esperei que das discussões e votações marcadas para 28 de Fevereiro na assembleia da república resultasse, se não a revogação, ao menos a suspensão do «aborto pornortográfico». E confirmou-se: apenas foi aprovada uma recomendação ao governo para criar um grupo de trabalho para acompanhar a aplicação do dito cujo. Ridículo! Pior foi ouvir as alarvidades de alguns dos alegados «representantes do povo», como as de que o AO90 está a ser implementado «com naturalidade» e «sem sobressaltos», e que é «do interesse de Portugal» liderá-lo. Em que país - ou em que planeta - vive esta gente? Como se tal fosse necessário, foi mais uma demonstração de que sensatez e vergonha não existem em São Bento - tanto na «ala» legislativa como na «ala» executiva. Certas pessoas não têm legitimidade nem capacidade para tomar decisões neste âmbito… e em outros. Pelo que não merecem ocupar as posições que ocupam e deveriam ser removidas delas. A bem ou a mal.)
(Adenda – Nunca esperei que das discussões e votações marcadas para 28 de Fevereiro na assembleia da república resultasse, se não a revogação, ao menos a suspensão do «aborto pornortográfico». E confirmou-se: apenas foi aprovada uma recomendação ao governo para criar um grupo de trabalho para acompanhar a aplicação do dito cujo. Ridículo! Pior foi ouvir as alarvidades de alguns dos alegados «representantes do povo», como as de que o AO90 está a ser implementado «com naturalidade» e «sem sobressaltos», e que é «do interesse de Portugal» liderá-lo. Em que país - ou em que planeta - vive esta gente? Como se tal fosse necessário, foi mais uma demonstração de que sensatez e vergonha não existem em São Bento - tanto na «ala» legislativa como na «ala» executiva. Certas pessoas não têm legitimidade nem capacidade para tomar decisões neste âmbito… e em outros. Pelo que não merecem ocupar as posições que ocupam e deveriam ser removidas delas. A bem ou a mal.)