Há mais uma
entidade privada que decidiu comportar-se, em relação ao «aborto
pornortográfico», como uma pública… ou seja, de uma forma cobarde e
colaboracionista: o Automóvel Clube de Portugal.
Tendo
verificado, no início deste ano, que a revista do ACP passou, abruptamente, a
utilizar o aberrante «acordês», telefonei para a sede daquele a 12 de Março
último, pedindo para falar com Carlos Barbosa, actual presidente da Direcção.
Em vez disso, puseram-me em contacto com Rosário Abreu Lima, antiga assessora
de Luís Marques Mendes e agora «dire(c)tora de comunicação institucional» do clube,
para além de (ir)responsável máxima da sua publicação principal; ela confirmou
que havia sido quem decidira proceder à alteração – tendo, aparentemente,
imposto a sua vontade ao próprio Carlos Barbosa. De qualquer forma, expus-lhe
os argumentos e os factos… irrefutáveis, aos níveis político, jurídico e
cultural, que tornam ilegítimo, ilegal e inútil o AO90. Aquela pessoa não me
apresentou propriamente um «contraditório»; não conseguiu, ou não quis, refutar
o que eu disse. Porém, isso não significou que tivesse concordado comigo,
porque as posteriores edições da revista do ACP continua(ra)m cheias de erros
ortográficos…
O caso do
Automóvel Clube de Portugal no âmbito do AO90 é especialmente insólito – e
irritante – porque, mais do que outras organizações, esta já teve ocasião de
presenciar, de se pronunciar… e de protestar contra transformações
injustificadas que trouxeram – que trazem – mais desvantagens do que vantagens.
Disse-o naquela conversa por telefone e reiterei-o
depois em mensagem de correio electrónico: de quem se manifestou, e bem, contra
as mudanças no trânsito em Lisboa, na zona da Praça do Marquês de Pombal e da
Avenida da Liberdade, seria de esperar uma atitude semelhante perante uma
situação… que tem muitas semelhanças. Como escrevi, «surpreende-me a atitude
passiva, de submissão, do ACP em
relação ao AO90: é que é o mesmo tipo de mentalidade distorcida, de raciocínio
deficiente, que está na origem tanto das alterações na ortografia portuguesa
como das alterações ao trânsito lisboeta. Em ambos os casos trata-se de dar “soluções”
a problemas que não existem; de lançar a confusão onde existia um mínimo de
estabilidade; de desviar para objectivos irrelevantes recursos que seriam mais
necessários e melhor aproveitados em áreas verdadeiramente prioritárias.»
Tanto
na conversa por telefone como na mensagem de correio electrónico também abordei as
consequências do AO90 no ensino: «quem causa essa “confusão” é quem pretende
impor esta anormalidade; mas, ainda mais caricato, repare na ainda maior
confusão que a utilização do AO90 causa em crianças e jovens que aprendem, e
cada vez mais cedo, o inglês, e que assimilam todas aquelas palavras com
consoantes “mudas”, consoantes e vogais repetidas, e até várias palavras com o
(alegado) arcaísmo do “ph”... Não seria melhor - quanto mais não seja por
sermos um país europeu! - não nos afastarmos da língua inglesa, e também, já
agora, da francesa, onde não se procede a absurdas “simplificações” que só prejudicam
a aprendizagem e que são potenciadoras de analfabetismo e de iliteracia?»
Aparentemente,
os actuais dirigentes do ACP não vêem qualquer contradição em, ao mesmo tempo
que se distanciam ortograficamente do inglês, designarem o seu programa de
educação rodoviária, dirigido para os mais novos, como… «ACP Kids». Serão as
crianças anglófonas residentes em Portugal os alvos prioritários desta
iniciativa? «Trocado por miúdos», a conclusão é inevitável: o maior clube
português, além de pelo provincianismo, foi atingido pela hipocrisia.
Simplesmente ridículo. É claro que existem outras instituições que se
submeteram ao AO90 e que, ao mesmo tempo, não dão ao «novo português» uma
utilização plena: veja-se a RTP e o seu serviço «Play»…
E
pensar que eu andei a gastar o meu tempo, e o meu «latim», a defender o ACP numa anterior situação em que foi discriminado. Não vale(u) a pena o esforço.
Não merece(ra)m o empenho. (Também no Esquinas (172).)