Em 2004, e certamente sob a influência da experiência que adquirira enquanto jornalista especializado em factos e figuras ligadas às tecnologias de informação e comunicação, estabeleci os primeiros contactos com vista à constituição de um grupo de trabalho, de uma equipa multidisciplinar, que, utilizando, se possível, os mais avançados sistemas e ferramentas de computação gráfica, procedesse, mais do que à reconstituição virtual (modelação e animação de exteriores e interiores), quase a uma autêntica «ressurreição» de um edifício desaparecido a 1 de Novembro de 1755 e que fora inaugurado... a 2 de Abril desse mesmo ano! Qual? O Teatro Real do Paço da Ribeira... que ficaria conhecido por Ópera do Tejo por, claro, ficar situado junto ao rio, no espaço entre os actuais Praça do Comércio e Cais do Sodré, mais ou menos onde está hoje o Arsenal da Marinha.
A que então era considerada a maior e a melhor «casa da música» da Europa foi erigida por iniciativa do Rei D. José. O monarca continuava assim a tradição, iniciada pelo seu pai e antecessor, D. João V, e prosseguida pela sua filha e sucessora, D. Maria I, de alto patrocínio, por parte da Casa Real portuguesa, à arte da música. Em consequência dessa autêntica política de «mecenato cultural», muitos músicos estrangeiros, em especial italianos, foram convidados a vir e mesmo a residir no nosso país, para tocarem, ensinarem e comporem. Como seria de prever, depressa se sentiu a necessidade de construir um edifício que não só corporizasse, desse forma concreta, a esta atitude, a esta estratégia para com a arte em geral e para com a música em particular, mas que também simbolizasse a benevolência, o bom gosto e a magnificência dos soberanos. Curiosamente, foi também a um italiano que se encomendou, em 1752, o projecto do teatro: Giovanni Carlo Bibiena, filho de outro famoso arquitecto, Francisco Bibiena. A construção terá sido dirigida por João Frederico Ludovice, que já trabalhara no Convento de Mafra. Todos os documentos existentes sobre o edifício – textos descritivos, testemunhos de nacionais e de estrangeiros, plantas (projectos) e desenhos tanto de antes como de depois (do terramoto) – coincidem no salientar da sua imponência e sumptuosidade, no realçar da sua superioridade tanto estética como técnica em comparação com tudo o que se havia feito no género até aí. A estreia decorreu ao som da ópera de David Perez «Alessandro nell’Indie», cuja encenação requeria, a dado momento, a presença simultânea de 25 cavalos no palco! Mas não era só este o único sector do teatro com dimensões desmesuradas: a plateia teria seiscentos lugares e haveria três ou quatro ordens de camarotes, cada uma delas com oito; existiria uma extensa área de apoio sob o palco, com camarins, oficinas e escadas para a entrada e saída dos artistas e para o acesso aos outros pisos e zonas. A Ópera do Tejo seguia o modelo de uma edificação dita de «três volumes» - palco, plateia e átrio – e todos os que nela entravam podiam admirar as «esplêndidas decorações» em que sobressaíam as cores branca e dourada. O Teatro de S. Carlos, aberto em 1793, viria a revelar-se, face ao seu ilustre antecessor, um edifício menor... em tamanho e em luxo.
Porquê um projecto como este? O seu interesse e, logo, a sua justificação, podem ser encontrados na própria história deste teatro e no período durante o qual ele, por «poucos instantes», existiu. Trata-se, no fundo, de resgatar ao esquecimento quase geral – quantos de nós sabiam que este edifício tinha existido? – (mais) uma prova irrefutável de que no passado os portugueses também alcançaram elevados patamares de excelência artística (artes como as entendemos hoje e «artes» enquanto ofícios), em que se colocaram ao nível, e mesmo acima, do que se fazia na Europa e no Mundo. Enfim, está em causa (re)colocar a Ópera do Tejo entre o inventário do património arquitectónico histórico português: não devem ser só as construções que permanecem (mais ou menos) inteiras e aquelas das quais subsistem apenas vestígios arqueológicos, físicos, «palpáveis», que merecem um lugar na «memória oficial».
A primeira pessoa que contactei, e que convidei, para a tarefa de «reconstruir» a Ópera do Tejo foi Maria Alexandra Gago da Câmara, docente e investigadora com trabalhos publicados sobre os teatros do século XVIII. E da entidade escolhida para «parceira tecnológica», a Associação Recreativa para a Computação e Informática, vieram os restantes elementos da equipa: Silvana Moreira e Luís Sequeira. A ARCI desenvolve a sua actividade com base – preferencial – na plataforma Second Life, mais uma iniciativa de vanguarda tecnológica - e filosófica? - de origem norte-americana.
Hoje, 1 de Novembro de 2005, passam 250 anos sobre a destruição, pelo Terramoto de Lisboa, do Teatro Real do Paço da Ribeira, ou Ópera do Tejo.
A que então era considerada a maior e a melhor «casa da música» da Europa foi erigida por iniciativa do Rei D. José. O monarca continuava assim a tradição, iniciada pelo seu pai e antecessor, D. João V, e prosseguida pela sua filha e sucessora, D. Maria I, de alto patrocínio, por parte da Casa Real portuguesa, à arte da música. Em consequência dessa autêntica política de «mecenato cultural», muitos músicos estrangeiros, em especial italianos, foram convidados a vir e mesmo a residir no nosso país, para tocarem, ensinarem e comporem. Como seria de prever, depressa se sentiu a necessidade de construir um edifício que não só corporizasse, desse forma concreta, a esta atitude, a esta estratégia para com a arte em geral e para com a música em particular, mas que também simbolizasse a benevolência, o bom gosto e a magnificência dos soberanos. Curiosamente, foi também a um italiano que se encomendou, em 1752, o projecto do teatro: Giovanni Carlo Bibiena, filho de outro famoso arquitecto, Francisco Bibiena. A construção terá sido dirigida por João Frederico Ludovice, que já trabalhara no Convento de Mafra. Todos os documentos existentes sobre o edifício – textos descritivos, testemunhos de nacionais e de estrangeiros, plantas (projectos) e desenhos tanto de antes como de depois (do terramoto) – coincidem no salientar da sua imponência e sumptuosidade, no realçar da sua superioridade tanto estética como técnica em comparação com tudo o que se havia feito no género até aí. A estreia decorreu ao som da ópera de David Perez «Alessandro nell’Indie», cuja encenação requeria, a dado momento, a presença simultânea de 25 cavalos no palco! Mas não era só este o único sector do teatro com dimensões desmesuradas: a plateia teria seiscentos lugares e haveria três ou quatro ordens de camarotes, cada uma delas com oito; existiria uma extensa área de apoio sob o palco, com camarins, oficinas e escadas para a entrada e saída dos artistas e para o acesso aos outros pisos e zonas. A Ópera do Tejo seguia o modelo de uma edificação dita de «três volumes» - palco, plateia e átrio – e todos os que nela entravam podiam admirar as «esplêndidas decorações» em que sobressaíam as cores branca e dourada. O Teatro de S. Carlos, aberto em 1793, viria a revelar-se, face ao seu ilustre antecessor, um edifício menor... em tamanho e em luxo.
Porquê um projecto como este? O seu interesse e, logo, a sua justificação, podem ser encontrados na própria história deste teatro e no período durante o qual ele, por «poucos instantes», existiu. Trata-se, no fundo, de resgatar ao esquecimento quase geral – quantos de nós sabiam que este edifício tinha existido? – (mais) uma prova irrefutável de que no passado os portugueses também alcançaram elevados patamares de excelência artística (artes como as entendemos hoje e «artes» enquanto ofícios), em que se colocaram ao nível, e mesmo acima, do que se fazia na Europa e no Mundo. Enfim, está em causa (re)colocar a Ópera do Tejo entre o inventário do património arquitectónico histórico português: não devem ser só as construções que permanecem (mais ou menos) inteiras e aquelas das quais subsistem apenas vestígios arqueológicos, físicos, «palpáveis», que merecem um lugar na «memória oficial».
A primeira pessoa que contactei, e que convidei, para a tarefa de «reconstruir» a Ópera do Tejo foi Maria Alexandra Gago da Câmara, docente e investigadora com trabalhos publicados sobre os teatros do século XVIII. E da entidade escolhida para «parceira tecnológica», a Associação Recreativa para a Computação e Informática, vieram os restantes elementos da equipa: Silvana Moreira e Luís Sequeira. A ARCI desenvolve a sua actividade com base – preferencial – na plataforma Second Life, mais uma iniciativa de vanguarda tecnológica - e filosófica? - de origem norte-americana.
Hoje, 1 de Novembro de 2005, passam 250 anos sobre a destruição, pelo Terramoto de Lisboa, do Teatro Real do Paço da Ribeira, ou Ópera do Tejo.
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