domingo, maio 01, 2005

Obras: "O elmo"

Há uma sala imensa imersa na escuridão
em cujo centro incide uma intensa luz.
Nele está exposto o elmo de uma armadura
que outrora pertenceu a um homem da Cruz.

É um capacete arredondado, amarelo, dourado,
e foi usado pelo mais audaz dos cavaleiros da estrada.
Muitas corridas ele disputou, muitas batalhas ele ganhou,
conduzindo o seu bólide, lançado na sua montada.

Era aos domingos que ele demonstrava a sua fé,
e ao chegar à meta fazia de cada circuito uma igreja.
Subia ao altar, erguia o troféu, bebia do cálice e orava,
celebrando uma missa depois da motorizada peleja.

Até os não crentes, como eu, se converteram,
levados pela sua coragem, que operava milagres.

No Estoril, suportando um dilúvio com afinco,
em mil novecentos e oitenta e cinco.

Em Suzuka, «e no entanto ele se move!»,
em mil novecentos e oitenta e nove.

Em Interlagos, sofrendo como mais nenhum,
em mil novecentos e noventa e um.

E no dia em que, com 34 anos, entraste para a eternidade,
ninguém quis chorar porque ninguém acreditou de imediato.
Visto do alto, o teu corpo, o teu carro, crucificado, imolado,
como um mártir prestes a ser canonizado e santificado.

Há quem diga que aquele que experimentar o teu elmo
poderá ver imagens indescritíveis nunca antes sonhadas.
Meu ídolo, meu irmão no idioma, que saudades eu tenho
de exultar com a tua arte e a tua velocidade inultrapassadas.


Ayrton Senna morreu a 1 de Maio de 1994... um domingo.
Poema (Nº 282) escrito em 2000.

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