A 5 de
Outubro de 2023 escrevi: «a cada ano que passa é cada vez mais difícil, se não
impossível, contrabalançar, atenuar, a desgraça da implantação da república em 1910
com a glória da assinatura do Tratado de Zamora em 1143, em que foi reconhecida
pela primeira vez a independência de Portugal.»
2024
não é uma excepção a essa regra; apesar de, entretanto, o PS ter finalmente
deixado o poder após ter perdido as eleições legislativas antecipadas de 10 de
Março na sequência da demissão do governo de António Costa, motivada por (mais) um
escândalo de corrupção – e consequentes investigações policiais e acusações
judiciais – envolvendo membros daquele, o governo do PSD e do como que «desenterrado» CDS-PP que o substituiu,
liderado por Luís Montenegro, não constituiu (até agora) a mudança profunda, o
corte decisivo com um passado recente e regressivo que seria de desejar e de
esperar. Aliás, e pelo contrário, parece que o famigerado «Bloco Central» de
outros tempos reapareceu: não muito tempo depois de tomar posse, Montenegro
declarou o seu apoio a Costa para este ocupar o cargo de Presidente do Conselho
Europeu e, já neste mês, entendeu-se com Pedro Nuno Santos para garantir a
aprovação do Orçamento de Estado de 2025, para além de ter prometido apoiar os órgãos de comunicação social «estabelecidos» e combater a «desinformação» (ou seja, implementar a censura) nas redes sociais. O que não surpreende de todo porque,
nunca é de mais recordar e salientar, o PSD não é nem nunca foi um partido de
direita; o que explica que os «laranjas» não pareçam muito incomodados com a
utilização de expressões ridículas como «pessoas que menstruam» em documentos
oficiais já sob a sua tutela, e que até o actual primeiro-ministro faça alusão
à aldrabice das alterações climáticas antropogénicas a propósito dos incêndios em Portugal, em
discurso proferido na assembleia geral da ONU! Enfim, estamos aparentemente perante mais um exemplo de «mudança de moscas».
O país
parece estar pior do que há 365 dias, e provavelmente até está. Vejamos: vários
hospitais continuam a encerrar com uma frequência alarmante os seus serviços de
urgência e de ginecologia-obstetrícia, e mais de milhão e meio de pessoas
(incluindo eu, esposa e filhas) não têm médico de família; a imigração maciça
(para a dimensão da nação) e descontrolada atinge níveis cada vez mais
preocupantes; a criminalidade violenta está a aumentar, e resulta também dessa
imigração crescente. Neste ano em que se assinalou o cinquentenário do 25 de Abril de 1974, eis o panorama desolador que se nos apresenta na celebração da
«liberdade». Sim, é verdade que a culpa por estes problemas cabe principalmente
ao PS, mas este contou durante quase 10 anos com a cumplicidade activa de um
chefe de Estado que mostrou não estar à altura do cargo. E muito bom seria que
os disparates de Marcelo Rebelo de Sousa se limitassem a sugerir que Portugal deve
«reparações» às suas ex-colónias; porém, a revelação de que ele se deixou
envolver em acções de (tentativa de) obtenção de favores promovidas pelo filho
enfraqueceu ainda mais a sua posição institucional, não estando inteiramente
fora de consideração, em última instância, eventuais implicações (i)legais. É para
isto que os herdeiros de Afonso Costa tanto se esforçaram a favor da eleição da
cabeça do regime? Cada vez mais caquéctica, patética, suportada por renovadas «brigadas
do reumático» e tendo na ridícula ortografia «acordizada» o seu dialecto oficial, a república, impúdica, é a ré maior.
Neste ano
também se comemora(ra)m, ou nem por isso, os 500 anos da morte de Vasco da Gama
e do nascimento de Luís de Camões – é, na verdade, interessante e mesmo notável
que o autor da nossa maior epopeia literária e o principal, real, protagonista daquela
tenham esta ligação especial. Nenhumas evocações dignas desta dupla efeméride foram
até ao momento realizadas ou estão previstas. Para isso também faz falta alguém
como Vasco da Graça Moura, falecido há 10 anos. E alguém como Agostinho da Silva, falecido há 30. Em Portugal, possivelmente, já não se produzem homens da estirpe daqueles dois; e, se ainda são produzidos, o mais provável é já terem emigrado.