Não. Não nos esqueceremos. Não os esqueceremos. Mas... como poderíamos? Como poderemos esquecer que pessoas que amámos desapareceram, da maneira mais cruel e injusta?
Eles não mereciam isto.
Morreram antes de experimentarem tantas emoções, tantas sensações que a vida pode, e deve, oferecer. Quantos sonhos ficaram por realizar? Muitos, muitos, muitos.
Saber que eles ficaram ali, esmagados, mutilados, crucificados, entre os ferros da carruagem da morte, é ainda difícil de acreditar. Ter-se-ão eles apercebido do que ia acontecer? Será que eles sofreram muito? Que dor, que agonia!
Nós, os que ficámos, também sentimos a dor e a agonia. Poderia ter sido connosco em vez de com eles.
Já se passou um mês, mas o sofrimento persiste. E daqui a um, cinco, dez, muitos anos, continuaremos a sofrer.
Que posso eu fazer? Poucos dias antes da tragédia, eu e o Chico, meu grande, meu querido amigo, tínhamos conversado longamente, sobre as nossas vidas, as nossas experiências, sobre aquilo que gostaríamos de fazer. A sua imagem e a sua voz ficaram marcadas em mim para sempre. Digam-me: que posso eu fazer? Que podem fazer os pais, os irmãos, os parentes, os amigos?
Enterrar os mortos e cuidar dos vivos? Está feito.
Nestas ocasiões, nunca faltam as condolências, os sentimentos de pesar, o luto oficial, os gestos de solidariedade, as tomadas de posição, os pedidos de esclarecimento, as exigências. No entanto, tudo isto não os trará de volta. Nada se pode fazer pelos que morrem.
Os inquéritos da CP também não os farão regressar. Os administradores, os gestores, os responsáveis, estão demasiado ocupados em conseguir o equilíbrio financeiro da empresa. Para eles, o acidente não passou de um pequeno contratempo. Vai ser necessário que sintam na carne horrores como este para se decidirem a fazer alguma coisa pelos que – por enquanto – estão vivos.
Entretanto, continuamos a correr riscos diariamente.
Quando é que a vida deixará de ser uma eterna fuga à morte? Quando?
Hoje, 5 de Maio de 2006, passam 20 anos sobre o grande acidente ferroviário da Póvoa de Santa Iria. Onde, entre os mortos, estavam amigos meus. Onde, entre os feridos, estavam amigos meus. Onde, entre os assustados, estavam amigos meus. Não me esqueci. Não os esqueci.
Artigo publicado no jornal Notícias de Alverca, Nº 17, 1986/6.
Eles não mereciam isto.
Morreram antes de experimentarem tantas emoções, tantas sensações que a vida pode, e deve, oferecer. Quantos sonhos ficaram por realizar? Muitos, muitos, muitos.
Saber que eles ficaram ali, esmagados, mutilados, crucificados, entre os ferros da carruagem da morte, é ainda difícil de acreditar. Ter-se-ão eles apercebido do que ia acontecer? Será que eles sofreram muito? Que dor, que agonia!
Nós, os que ficámos, também sentimos a dor e a agonia. Poderia ter sido connosco em vez de com eles.
Já se passou um mês, mas o sofrimento persiste. E daqui a um, cinco, dez, muitos anos, continuaremos a sofrer.
Que posso eu fazer? Poucos dias antes da tragédia, eu e o Chico, meu grande, meu querido amigo, tínhamos conversado longamente, sobre as nossas vidas, as nossas experiências, sobre aquilo que gostaríamos de fazer. A sua imagem e a sua voz ficaram marcadas em mim para sempre. Digam-me: que posso eu fazer? Que podem fazer os pais, os irmãos, os parentes, os amigos?
Enterrar os mortos e cuidar dos vivos? Está feito.
Nestas ocasiões, nunca faltam as condolências, os sentimentos de pesar, o luto oficial, os gestos de solidariedade, as tomadas de posição, os pedidos de esclarecimento, as exigências. No entanto, tudo isto não os trará de volta. Nada se pode fazer pelos que morrem.
Os inquéritos da CP também não os farão regressar. Os administradores, os gestores, os responsáveis, estão demasiado ocupados em conseguir o equilíbrio financeiro da empresa. Para eles, o acidente não passou de um pequeno contratempo. Vai ser necessário que sintam na carne horrores como este para se decidirem a fazer alguma coisa pelos que – por enquanto – estão vivos.
Entretanto, continuamos a correr riscos diariamente.
Quando é que a vida deixará de ser uma eterna fuga à morte? Quando?
Hoje, 5 de Maio de 2006, passam 20 anos sobre o grande acidente ferroviário da Póvoa de Santa Iria. Onde, entre os mortos, estavam amigos meus. Onde, entre os feridos, estavam amigos meus. Onde, entre os assustados, estavam amigos meus. Não me esqueci. Não os esqueci.
Artigo publicado no jornal Notícias de Alverca, Nº 17, 1986/6.
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